quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Método ao diagnóstico e receita Floral de BACH

Os estudos do Dr. Edward Bach com o proposito de prescrever de maneira eficiente a composição equilibrada de essências em uma formula especifica ao tratamento consiste ao paciente em responder a um questionário elaborado na relação essência - sintomas.

Nos Quadros abaixo de A à G; as essências foram agrupadas por cor/grupo, finalizando na cor verde com a composição do Remedy Rescue.






Na planilha abaixo as questões correspondentes a cada essência, onde o paciente deverá expressar um valor, peso, nota de 1 a 5 sobre sua sensação. Recomendamos ao facilitador para um maior controle dos aspectos que registre a data dos apontamentos, sujeito a avaliação periódica em relação ao paciente que poderá atualizar o questionário periodicamente.

Este questionário elaborado em planilha eletrônica (excel) apresenta formula de calculo que facilita a contabilidade e destino de percentuais para cada essência, distribuindo os valores também por grupo, identificando e determinando assim a composição de essências ao receituário.

Abaixo, um demonstrativo dos resultados obtidos. Estou disponibilizando a planilha eletrônica no link:
http://www.4shared.com/document/xmx8NPDn/Floral_de_Bach_-_estudo.html
http://www.4shared.com/document/OiFOMRiT/Floral_de_Bach_-_diagnstico.html
http://www.4shared.com/document/4dSq0UIG/Florais_de_Bach.html

Maiores esclarecimentos envie email: jcnavegador57@gmail.com / Julio Cesar


quarta-feira, 14 de setembro de 2011

HGCB - Ciganos no Brasil: Século XIX (vídeos: Cigana)

Elaborar estimativas da população cigana no Brasil na época de Dom João VI (1808-1821) é bastante arriscado. Infelizmente, para as autoridades da época e os historiadores atuais, a mobilidade geográfica e a marginalidade social da maioria dos ciganos tornaram os ciganos praticamente ausentes nos recenseamentos e registros paroquiais.

Conforme Donovan: "Nenhuma evidência foi trazida à luz, ainda, sobre, por exemplo, a taxa de reprodução natural: eram as famílias ciganas no Brasil maiores, menores, ou do mesmo tamanho que outras famílias, brancas ou de forros?". Tanto os depoimentos de cronistas, viajantes e memorialistas, quanto a documentação jurídica e policial, na maioria das vezes não quantificam o número de indivíduos dos bandos ciganos encontrados. Apesar da imprecisão das informações sobre diversos bandos ciganos, fazendo-se um esforço considerável, chega-se a algumas estimativas. Ao que tudo indica, numericamente, os principais grupos de ciganos sedentários estavam na Bahia e no Rio de Janeiro, ou seja, nos dois mais importantes portos marítimos da época.
Sobre os ciganos residentes no Rio de Janeiro, no início do século XIX, sabemos que ... quatrocentos ciganos formavam uma comunidade na periferia sul da cidade e outro grupo vivia dentro da cidade em torno da Rua dos Ciganos, Campo de Sant-'Anna e o mercado de escravos da cidade. Para outras províncias, como a Bahia, são mencionados bandos menores compostos de pelo menos duas dezenas de ciganos. Porém a documentação de modo algum é exaustiva. Donovan acredita que "excluindo escravos e outros itinerantes morando com eles, numa estimativa conservadora de no mínimo quatro até sete mil ciganos viviam no Brasil nas décadas precedendo a independência", conquistada em 1822.

Alguns testemunhos dão uma idéia do número de indivíduos em bandos ciganos. Em viagem ao norte de Minas (em Contendas, atual Brasília de Minas), James Wells encontrou um grupo de ciganos que "compunha-se de cerca de cinqüenta homens e mulheres e diversas crianças." Um fato interessante é que tal comunidade já então era sedentária. No terreno, existiam "umas poucas casas e certa quantidade de barracas brancas." As “barracas brancas” certamente eram barracas ou tendas de lona. Em todo século XIX predominam noticias sobre ciganos nômades transitando pelo território mineiro, o que dificulta ainda mais as estimativas sobre a população cigana. Mas Raimundo José da Cunha Matos, já em 1837 descrevia as "pequenas casas" dos ciganos em Minas, ou seja, casas de ciganos sedentários. Consta que estes ciganos exerciam as mais diversas profissões. Moraes Filho cita um velho cigano, que seria descendente de ciganos banidos de Portugal em 1718, segundo o qual “logo que desembarcaram [no Rio de Janeiro]... alojaram-se em barracas no Campo dos Ciganos, enorme e inculta praça que se estendia da Rua do Cano até a Barreira do Senado.

Empregavam-se eles ... no trabalho dos metais: eram caldeireiros, ferreiros, latoeiros e ourives; as mulheres rezavam de quebranto e liam a sina”. Ou seja, mais uma vez temos notícia de ciganos que eram trabalhadores honestos. Era principalmente nas suas transações comerciais que os ciganos eram acusados de serem ladrões e trapaceiros. O já citado Saint Hilaire, em 1819, teve contato com ciganos, aparentemente sedentários ou semi-sedentários, de São Paulo e informa:
Havia em Urussanga, enquanto lá estive, um bando numeroso de ciganos. Estes homens moravam na aldeia vizinha a Mogy Guassú e circulavam pelas vizinhanças para fazerem, de acordo com o feitio de sua gente, barganhas de mulas e de cavalos. (...) Pareciam extremamente unidos e tiveram para comigo grandes gentilezas. Não lhes ouvi falar língua diversa do portugues. Estavam vestidos como os brasileiros, mas traziam cabelos e barbas compridas (contrariando o costume geral do país). Estavam todos assaz bem vestidos, possuíam escravos, cavalos e cargueiros, bastante numerosos. (...) Os ciganos de Urussanga passaram o dia todo tentando fazer barganha com os tropeiros das duas tropas que comigo compartilhavam o rancho. Em tom de caçoada falei a um deles da pouca probidade de que sua nação é acusada. - Logro tanto quanto posso, respondeu-me seriamente, mas todos aqueles que negociam comigo fazem a mesma coisa. A única diferença que entre nós existe é que esta gente solta grandes berros quando se vê lograda e eu quando me ludribriam nada digo a quem quer que seja.
Enquanto Saint Hilaire tenta entender os ciganos e o seu modo de vida, o mesmo não acontece com o preconceituoso viajante francês Freycinet (1817-20):
No número dos elementos de que se compõe a população do Rio de Janeiro, nenhuma sem dúvida alguma é mais digno de espicaçar curiosidade do que a presença dos indivíduos desta nação cosmopolita ..... aqui conhecida, como em Portugal, pelo nome de ciganos. (...) Dignos descendentes dos párias da Índia .... os ciganos do Rio de Janeiro ostentam como eles o hábito de todos os vícios e propendem para todos os crimes. Possuidores de grandes riquezas, em sua maioria ostentam considerável luxo em roupas e cavalos, sobretudo por ocasião de suas bodas que são muito suntuosas, comprazendo comumente na devassidão crapulosa. Há ociosidade absoluta. Falsos e mentirosos, furtam quanto podem ao comerciarem e também são sutis contrabandistas. Aqui, como por toda parte onde se encontra esta abominável raça, suas alianças só se fazem entre eles. Têm sotaque e até mesmo uma gíria própria. Por uma esquisitice absolutamente inconcebível, o governo tolera esta peste pública: duas ruas privativas até lhe são destinadas na vizinhança do Campo de Sant’Anna - a Rua e a Travessa dos Ciganos.

Com a mudança de família real portuguesa para o Brasil, em 1808, vieram também alguns milhares de portugueses e, segundo Moraes Filho, “Do interminável séquito da família real poucos prestavam para alguma coisa. Eram fidalgos e vadios. Aos fidalgos mandou-se dar pensões do tesouro... Os vadios foram empregados nas repartições que se criaram para esse fim”. Tudo indica que entre estes funcionários públicos “vadios” encontravam-se também ciganos, e que muitos deles foram contemplados com o cargo então vitalício e hereditário de oficial de justiça. Além disto, há referências a ciganos artistas que alegraram várias festas reais. Porém, a atividade econômica principal dos ciganos parece mesmo ter sido o comércio ambulante, de animais, escravos ou objetos, viajando pelos sertões do Brasil. Para a região Nordeste temos informações, embora de segunda mão, através do inglês (mas nascido em Portugal) Henry Koster, que viveu em Pernambuco de 1809 a 1815:
São muito falados para que se possa esquecer os ciganos. Ouvi assiduamente citar esse povo mas nunca me foi possível avistar um só desses homens. Bandos de ciganos tinham outrora o hábito de aparecer, uma vez por ano, na aldeia do Pasmado, e noutras paragens dessa zona, mas o último governador da província era inimigo deles e tendo feito alguma tentativa para prender alguns, as visitas desapareceram. Descreveram-nos como homens de pele amorenada, feições que lembram os brancos, bem feitos e robustos. Vão errando, de lugar em lugar, em grupos de homens, e mulheres e crianças, permutando, comprando e vendendo cavalos e ninharias de ouro e prata. As mulheres viajam a cavalo, sentadas entre os cestos dos animais carregados e os meninos são postos dentro dos cestos, de mistura com a bagagem. Os homens são cavaleiros eméritos .... Dizem que não praticam religião alguma, não ouvindo missa nem confessando seus pecados. E é sabido que jamais casam fora da sua nação.

Koster morou durante muitos anos no litoral pernambucano e fez duas longas viagens pelo interior nordestino, na época uma verdadeira aventura, e é admirável que mesmo assim nunca tenha encontrado pessoalmente ciganos, o que faz supor, primeiro, que não viviam mais ciganos no litoral nordestino/pernambucano, e segundo, que os ciganos eram bastante raros no interior, ou então até talvez inexistentes, por causa das contínuas perseguições.

HGCB cap. 1 - Os ciganos na Corte do Rio de Janeiro (videos: Alma Cigana)

A presença de ciganos no Rio de Janeiro é certa, desde pelo menos o início do século XVIII. Primeiramente ocuparam uns brejos, que pela dificuldade de edificar e pela insalubridade, eram terrenos desvalorizados. Esta área viria a ser o Campo de Sant'Ana, conhecido também por Campo dos Ciganos. Posteriormente, a partir de 1821, viria a ser o Largo do Rossio (atual Praça Tiradentes). Este terreno era remanescente de duas chácaras que ficavam em lados opostos:

... uma área que parece ninguém pretendera por inaproveitável. Constituída de brejos e alagadiços que as menores chuvas inundavam, tinha fama de pestilenta pelos miasmas que dela se exalavam. Os pauis que a formavam tornavam-na imprópria tanto para a lavoura como para que nela se erigissem construções permanentes. Nesse pantanal abandonado e desprezado, onde ninguém os viria incomodar, ergueram os seus míseros e toscos casebres de moradia dos ciganos.
Quando Luís de Vasconcellos e Sousa. vice-rei entre 1779 e 1790, iniciou o saneamento desses brejos, os ciganos foram obrigados a se mudar:
Não foram para longe. Com o consentimento tácito ou formal da Ordem do Carmo, instalaram–se na chácara que fôra de Paula Carvalho, junto às divisas das terras de Coelho da Silva. Aí levantaram as suas casas, formando uma nova rua, em ângulo reto com a de São Jorge e que deles tomou o nome, conservando-o até à época da Independência. Desde então até hoje a antiga rua dos Ciganos manteve a designação de rua da Constituição, ligando o Largo do Rossio à atual Praça da República.
Foi nessa área que concentrou-se, majoritariamente, a população cigana no Rio durante todo o século XIX, quando viveram momentos radicalmente extremos em sua economia e em seu status social. Nos anos que precederam a Independência, durante a permanência da Corte portuguesa no Brasil, parece ter sido o momento de maior aceitação e de valorização romântica da comunidade cigana, ao menos no Rio de Janeiro, durante o oitocentos. Essa comunidade vivia em pleno florescimento econômico e artístico. Apesar de a comunidade do campo de Sant'Ana ter se formado a partir de miseráveis famílias deportadas no início do século XVIII, diversos ciganos tornaram-se realmente ricos. Entre estes os que tiveram maior sucesso econômico foram os comerciantes de escravos, como veremos mais adiante em detalhes. Mas eram muitas as suas profissões. Além da atividade artística, o ofício de meirinho tinha para eles especial atração. Talvez por ser a porta modesta que arrombavam para derrogar a velha proibição do exercício de cargos públicos. O fato é que houve época em que quase todos os oficiais de justiça do fôro do Rio de Janeiro eram ciganos. Apesar da diminuição da comunidade cigana em fins do século XIX, mesmo assim, ainda havia ciganos nesse trabalho. Recordando essa época, o lingüista Raul Pederneiras dá o seguinte depoimento a Oliveira China:
Tivemos aqui um quarteirão habitado por ciganos, quando eu era estudante do Pedro II. A rua principal era a da Constituição (que o povo denominava 'Rua dos Ciganos'). Mais tarde, quando estudante de Direito, encontrei nessa mesma rua, muitos ciganos em atividade. Era notável o número delles na funcção de 'officiaes de justiça', ou meirinhos e, nessa mesma rua estavam situados os principaes juizados e cartorios forenses. (...) Anos depois, alguns elementos típicos, ainda meirinhos (a profissão passava de pais a filhos), ainda resistiam esparsos pelos cartórios e juizados, sendo notável o característico racial da tez morena bronzeada e os olhos garços.

Entre os comerciantes de escravos, quem mais destacou-se foi José Rabelo, "que acumulou grande fortuna, sendo, na época da Independência, um dos homens mais ricos da cidade." Entre os ciganos que moravam na Rua dos Ciganos, nenhum foi mais rico que José Rabelo, "grande traficante de escravos no Valongo no começo do Oitocentismo." Segundo Coroacy, este José Rabelo
... morava em casa própria no Campo de Sant'Ana (praça da República) e diz a lenda, pois deve ser lenda, que guardava grande parte da fortuna em barras de ouro depositadas no fôrro da casa. Tamanho seria o peso desse ouro acumulado que Rabello se viu forçado a escorar com colunas de ferro o teto para que não lhe caísse sobre a cabeça. Invencionices de má língua do povo, provavelmente. Rabello, que obtivera uma patente militar, dedicava-se a operações bancárias e financeiras. O que significa que era prestanista. A juros algos naturalmente. E a lenda das barras de ouro escondidas no fôrro teria sido inventada por algum dos que a ele recorreram.

Embaixada da Polônia em Brasília em evento esperantista, 11/12/2009 Alma Cigana Autor: Mario Mascarenhas.

Possivelmente, os ciganos mais ricos tentassem se passar por brancos de origem européia (não-ciganos), ocultando sua identidade, pela posse de bens (escravos e jóias, por exemplo), desde que "a posse de bens tinha a curiosa faculdade de 'branquear' até mesmo pessoas de tez mais escura." Pelo menos no Rio de Janeiro, onde estavam os ciganos mais ricos do Brasil, eles deviam se interessar em se passar por brancos "autênticos", para conseguir negociar sem que os clientes desconfiassem de possíveis trapaças. Não apenas a riqueza fez com que ciganos se destacassem, também o comportamento de alguns os tornou notáveis. "O rico e humanitário cigano Joaquim Antônio Rabelo" (trata-se do mesmo José Rabelo) patrocinaria as danças e homenagens ciganas, por ocasião dos desposórios de D. Pedro I com a Princesa Leopoldina, em 1813. Ele recebeu a patente de "sargento-mor do 3º regimento de milícias da corte", que "lhe foi concedida a mercê de melhoramento de reforma no posto de tenente-coronel." Além disto, na mesma ocasião, foram nomeados alferes diversos ciganos "agregados das Ordenanças da Corte."

Para os portugueses e outros europeus que chegavam em grande quantidade ao Rio, após a transferência da família real, ávidos por encontrar os mais exóticos tipos humanos nos trópicos, os ciganos correspondiam bem a esta expectativa. Atos inconcebíveis em Portugal ocorriam no Rio, como a participação de dançarinos ciganos em festividades reais. Os ciganos participaram das festividades de casamento da princesa da Beira, filha mais velha de D. João VI, com um infante de Espanha, em 1810, dançando no desfile o fandango espanhol, "em que os homens entravam na praça a cavalo com as mulheres à garupa." Segundo o testemunho ocular do Barão de Eschewege,
... os moços dessa nação entraram no circo montando belos cavalos ricamente ajaezados e levando na garupa as suas noivas. Os casais saltaram ao chão com incrível agilidade e executaram, em conjunto, as mais lindas danças que já vi até hoje. Todos os olhos se achavam voltados para os jovens ciganos, e se tinha a impressão de que as outras danças tinham por único objetivo fazer ressaltar a beleza das suas.
Logo depois, um outro evento demonstraria, mais nitidamente ainda, a nova imagem que os portugueses e seus descendentes formavam dos ciganos. Quando se comemorou a elevação do Brasil a Reino Unido em 1815, no segundo dos três dias de celebrações, "Dom João VI levou a corte inteira e a delegação estrangeira do Campo dos Ciganos para uma tarde e noite de danças e entretenimento. "Posteriormente, quando dos desposórios do Príncipe Real Dom Pedro, em 1818, os ciganos foram novamente convidados para apresentarem suas danças e músicas:
... e logo entrou na praça a célebre dança dos ciganos, que se compunha de seis homens, e outras tantas mulheres vestidos todos com muita riqueza; depois tudo quanto apresentaram de ornato era veludo; e ouro: precedia-os uma banda de música instrumental; e sobre um estrato fronteiro às reais pessoas executaram com muito garbo, e perfeição, várias danças espanholas, que mereceram universal aceitação.

Segundo alguns rumores, Dom João VI cultivava um fascínio especial por uma cigana. O que visto em perspectiva não deixa de ser irônico, pois o pouco apreço de seu avô (Dom João V) pelos ciganos foi o responsável pela vinda de dezenas de famílias acorrentadas para o Brasil. Em meados e fins da década de 1810, o Campo dos Ciganos "havia se tornado o bairro boêmio do Rio, uma área conhecida por uma vida noturna alegre e pelos artistas brasileiros e estrangeiros que ali viviam." Também foi cenário para algumas das divertidas noitadas de Dom Pedro que, como seu pai, lançava olhares às jovens e belas ciganas:
Mais para o Rocio vivia um casal de artistas famosos (ciganos), João Evangelista da Costa e a Ludovina, de encantos fabulosos. Destabocado como era, D. Pedro I saiu certa noite a persegui-la depois do teatro, entrando-lhe pela porta a dentro, talvez por não vê-la fechar-se à sua cara. Mas era que lá em cima, no sobrado, se festejava um aniversário, estando a mesa posta para a ceia e a sala repleta de comediantes e cantores da deles e de outras companhias. E todos, numa reverência, o saudaram ruidosamente, confessando-se honrados em sentar-se pela primeira vez ao seu lado numa festa..."

Ressalta-se que os contatos entre a família real e alguns ciganos cariocas não significavam boas relações entre os demais ciganos e a sociedade como um todo. Mesmo durante a estada da corte portuguesa no Rio, período em que o status dos ciganos esteve mais elevado, os ciganos não deixaram de estar associados à criminalidade. Há inúmeros testemunhos de viajantes que falam do temor popular, no interior do país, quanto a supostos furtos cometidos por ciganos. Em 1823, dois anos depois da volta da família real, Maria Graham escreve em seu diário de viagem: "Alguns deles dedicam-se ao comércio e muitos são extremamente ricos, mas são ainda considerados ladrões e trapaceiros, e chamar um homem zíngaro (cigano) equivale a chamá-lo de velhaco." Assim, em fins da década de 1820, os ciganos já não eram mais requisitados para se apresentarem nas festividades na Corte do império recém-fundado. Não havia qualquer possibilidade de eles servirem ao perfil que se queria para o "ser brasileiro". Já nos inícios do século XIX, a questão da raça era um tema fundamental na definição da identidade nacional, mesmo que através de uma afirmação romântica do exotismo. No momento imediatamente posterior a Independência, buscou-se descrever a nação de forma “ahistórica”, via paisagem natural. Afluíam naturalistas ao Brasil, a princípio, procurando pesquisar a flora e a fauna, mas que passaram a se interessar pela população, principalmente das cidades, distinguindo os tipos humanos e analisando os efeitos da miscigenação.

A gradual incorporação do discurso científico ao conceito de "ser nacional" teve seu marco bem assentado no ano de 1838, quando foi criado o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Isso ia ao encontro da prática historiográfica que vinha se desenvolvendo na Europa. Em meados do século XIX, o Império elegeu o indígena como seu símbolo fundamental e fez-se o discurso de que a miscigenação entre o branco, o negro e o índio promoveria o patriotismo e consolidaria a nação. Diante disso, a presença dos ciganos na composição da população seria omitida, pois era uma minoria difícil de ser apreendida por esse discurso nacionalista. Negando-se aos ciganos o direito à história, tentava-se colocá-los à margem da "boa sociedade." Como se verá mais adiante, paulatinamente, uma série de medidas repressivas fecharam o cerco sobre os ciganos.

Tema da novela "Alma cigana", exibida na TV Tupi em 1964 com Ana Rosa, Amilton Fernandes, Marisa Sanches, Elísio de Albuquerque entre outros. Música: Jeux Interdits - Salatiel Coelho.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

HGCB cap. 1 - Ciganos no Brasil: Séculos XVII e XVIII (video: Ciganos do Porto)

Com as fontes históricas conhecidas até agora, é praticamente impossível procurar exatidão em quaisquer dados histórico-demográficos sobre os ciganos no Brasil. As informações sobre os ciganos nos Séculos XVI e XVII são muito limitadas, embora sejam conhecidos documentos relativos às políticas anti-ciganas portuguesas.

Essa documentação referente ao Brasil torna-se menos escassa somente a partir do Século XVIII. Isto porque a partir do reinado de Dom João V, que durou de 1706 a 1750, a perseguição aos ciganos portugueses se acentuou e dezenas deles foram degredadas para as colônias ultramarinas, inclusive para o Brasil. No entanto, é bastante difícil, praticamente impossível, determinar quantos ciganos vieram para o Brasil até 1822. Segundo Donovan: "Enquanto a Gazeta de Lisboa menciona grandes grupos de deportados, nenhuma lista oficial de criminosos exilados tem sido trazida à luz. Assim o número de indivíduos e famílias embarcadas nos cargueiros anualmente, o volume daqueles transportados, permanece desconhecido.” Inclusive o número de ciganos deportados, que certamente constavam nestas listas de criminosos exilados, e eventualmente os motivos dessas deportações. Mas não há dúvida alguma que os primeiros ciganos que desembarcaram no Brasil foram oriundos de Portugal, e que estes não vieram voluntariamente, mas expulsos daquele país. Foi o que parece ter acontecido, por exemplo, já em 1574, com um certo João de Torres e sua mulher Angelina que foram presos apenas pelo fato de serem ciganos. Inicialmente João foi condenado às galés e Angelina deveria deixar o país dentro de dez dias, levando seus filhos. Alegando, no entanto, que “era fraco e quebrado, e não era para servir em coisa de mar e muito pobre, que não tinha nada de seu”, João pediu para poder sair do Reino, ou então que pudesse ir para o Brasil para sempre.

O “pobre” cigano João de Torres deve ter pago um bom suborno porque logo, em poucos dias, seu pedido foi deferido e a pena foi mudada para “cinco anos para o Brasil, onde levará sua mulher e filhos”. O número de filhos não é mencionado, mas devem ter sido alguns poucos, talvez dois ou três, porque certamente não iriam deportar gratuitamente para o Brasil um (auto-declarado) miserável e inútil cigano João, sua mulher e uns dez ou quinze filhos. Por causa deste documento João de Torres sempre é citado como o primeiro cigano a entrar no Brasil. Não se sabe, porém, se ele realmente embarcou (ele pode ter pago outros subornos para se livrar disto), se “fraco e quebrado” aguentou a longa viagem marítima, na qual certamente não teve tratamento de primeira classe, ou se chegou ao seu destino, nem aonde desembarcou, nem quanto tempo ficou no Brasil, nem se depois dos cinco anos voltou a Portugal, algo pouco provável. Ou seja, nada, mas absolutamente nada se sabe sobre o destino dele e de sua família. É possível que nunca tenha chegado ao Brasil. De qualquer forma, se ele realmente embarcou, veio acompanhado apenas pela mulher e alguns poucos filhos e não “liderando um bando de ciganos” ou “chefiando numerosas famílias que o acompanhavam”, como erroneamente informam alguns autores, que preferiram usar a fantasia em vez de ler o documento original.

A deportação de ciganos portugueses para o Brasil, ao que tudo indica, só começou mesmo a partir de 1686. Dois documentos portugueses daquele ano informam que os ciganos deviam ser degredados também para o Maranhão. Antes eram degredados somente para as colônias africanas. A escolha da Coroa pela capitania do Maranhão visava pelo menos a dois objetivos. Primeiro, colocar os ciganos "bastante afastados das áreas brasileiras de mineração e de agricultura assim como longes dos principais portos da colônia, do Rio de Janeiro a Salvador." Segundo, esperava-se que os ciganos ajudassem a ocupar extensas áreas dos sertões nordestinos, então ainda ocupadas por índios. Ainda que perigosos, preferia-se os ciganos aos índios. Não foram ainda descobertos documentos com dados sobre o número de ciganos deportados para o Brasil nesta época, para quais capitanias e por quais motivos. Mas sabemos que também outras capitanias receberam ciganos, principalmente a partir de 1718, outro marco na política portuguesa de deportação de ciganos. Segundo Donovan:
"Como uma forma de expor publicamente sua determinação João V ordenou a deportação imediata de uma pequena comunidade cigana consistindo de cinquenta homens, quarenta e uma mulheres e quarenta e três crianças, então detidos na prisão municipal de Limoeiro. Seu banimento foi um procedimento cuidadosamente planejado, servindo como um ato de Estado. A justiça do início do período moderno era praticada de uma forma deliberadamente cerimonial. Oficiais publicizavam o evento antes através de anunciamentos boca a boca ou públicos. Nesse caso o embarque do navio brasileiro, que sempre atraía grandes multidões, forneceu o palco. A visão dos ciganos partindo acorrentados demonstrava para os espectadores o esforço da coroa pelo controle social. Isso é a publicação dos banimentos subsequentes assinalavam, sem dúvida, que a assimilação não era mais uma opção dos ciganos para escapar de seu status criminoso."

Em 15 de abril daquele ano, foi expedida comunicação de Lisboa para o governador de Pernambuco, apoiando-se no decreto já mencionado de Sua Majestade. Informa-se o embarque de ciganos para aquela capitania, mas parte dos quais deveria ser remetida depois para o Ceará/Brasil, e outra parte para Angola/África. Também devia-se tomar cuidado para que nenhum cigano ficasse em Pernambuco, e aos governadores do Ceará e de Angola recomendou-se que não deixassem os ciganos retornar a Portugal, nem permitissem o uso de sua língua, chamada também de geringonça. Apesar disto, muitos ciganos permaneceram em Pernambuco, entre eles alguns que solicitaram licença de permanência, ou então permissão de mudar-se para outras províncias. Pereira da Costa informa que:
“(.....) ficaram na capitania [de Pernambuco] vários ciganos, aos quais concedeu o vice-rei, por ordem de 14dez1720, que eles fossem estabelecer a sua moradia em Sergipe del-Rei. Permanecendo em Pernambuco avultado número de ciganos, apesar das ordens em contrário, representa contra eles a câmara de Olinda em 16dez1723, dizendo na carta que dirigiu ao soberano, que viviam eles espalhados pela capitania, cometendo toda a sorte de crimes, principalmente de furtos e assassinatos, e em tal escala, que não se podia mais tolerá-los, concluindo que S. Majestade houvesse de os mandar para o Ceará, onde poderiam prestar algum serviço na conquista do gentio bravio, e ficar assim o povo com algum sossêgo”.

Também em 1718, foram enviadas de Portugal para a Bahia "diversas famílias de ciganos." Por isto, Dom João V ordenou ao vice-rei, de forma semelhante ao que já havia feito ao governador de Pernambuco, o seguinte:
"Eu, Dom João, pela Graça de Deus, etc., faço saber a V. Mercê que me aprouve banir para essa cidade vários ciganos - homens, mulheres e crianças - devido ao seu escandaloso procedimento neste reino. Tiveram ordem de seguir em diversos navios destinados a esse porto, e, tendo eu proibido, por lei recente, o uso de sua língua habitual, ordeno a V. Mercê que cumpra essa lei sob ameaça de penalidades, não permitindo que ensinem dita língua a seus filhos, de maneira que daqui por diante o seu uso desapareça."

Os documentos históricos comprovam que a então comunidade cigana em Salvador apresentou um grande crescimento demográfico e econômico. A primeira capital colonial brasileira tornou-se também a mais importante cidade para os ciganos do Brasil. Consta que em Salvador os ciganos inicialmente foram alojados no bairro da Mouraria, e posteriormente também no bairro de Santo Antonio d’além do Carmo”. De Salvador saíram muitos ciganos rumo a região das minas (hoje Minas Gerais), causando grande incômodo às autoridades. Sem indicarem as fontes nas quais se basearam, historiadores como Augusto de Lima Júnior e João Dornas Filho apontam a presença de ciganos nas Minas de Ouro (hoje Minas Gerais) já nos fins do século XVII. Lima Júnior acredita que os ciganos chegaram a Minas logo após o descobrimento do ouro: "os judeus e cristãos-novos, bandos imensos de ciganos, atiraram-se para as terras ultramarinas, buscando a fortuna e a redenção na largueza dos sertões infindos, onde dificilmente chegariam as importunações do Santo Ofício."
Na verdade, sabe-se que a Inquisição se preocupou pouco com os ciganos. O autor ainda informa sobre a preocupação das autoridades com eles. Descrevendo a alarmante escassez de víveres de 1700 em Ouro Preto e arredores, comenta que, naquele ambiente de desespero e desolação, "os negros escravos e os bandos de ciganos bem armados salteavam os vivos e saqueavam os mortos." Mais adiante, quando o autor menciona "a confusão e a desordem reinantes nessas Minas Gerais recém-nascidas", acrescenta que "bandos de ciganos ágeis e aguerridos percorriam as estradas entregues à mais solta rapina." Para esses supostos crimes ciganos, Lima Júnior também não apresenta nenhuma fonte.

João Dornas Filho, sem apresentar qualquer documento, afirma que os ciganos chegaram a Minas Gerais possivelmente penetrando "pelo Rio São Francisco com as primeiras entradas baianas." Mesmo tendo-se dúvida quanto à presença de ciganos em Minas Gerais no Século XVII, ou mesmo antes, quando das primeiras entradas baianas, parece bem provável que a penetração tenha se dado pelo vale do São Francisco. Pela extensão e características físicas do território, ainda que Minas dispusesse de inúmeras estradas e caminhos, eram os vales fluviais que cumpriam a função de ser a principal forma de adentrar o sertão. As afirmações dos historiadores acima são duvidosas, porque não citam fontes documentais. Certamente alguns ciganos chegaram até as Minas de Ouro em seus primeiros tempos. Mas foi somente a partir de 1718 que diversas famílias ciganas vieram juntas para o território mineiro. A presença comprovada de ciganos em Minas Gerais é registrada desde o início do Século XVIII, ao que tudo indica contrariando as intenções originais da Coroa portuguesa.

Dom Lourenço de Almeida, num bando de 15jul1723, fazendo uma variação do decreto de 1718, recorda que El Rey havia remetido ciganos ao Brasil, apenas para que seguissem em direção a Angola, e não para que ficassem no continente americano. Acrescentando, reclama: "por ser hua gente muito prejudicial aos seos povos porque não vivem se não dos roubos q. fasem, cometendo exacrandos insultos, e porque pelo descuido que houve el algua das praças da Marinha vieram para estas Minas vartas familias de ciganos, onde podem fazer mayores roubos q. em outra nenhua parte (...)."
Um documento de 1723, de Vila Rica (hoje Ouro Preto) informa que “pelo descuido que houve em alguma das praças da Marinha vieram para estas Minas várias famílias de ciganos”, e manda prender todos eles e remeter para o Rio de Janeiro, de onde então seriam deportados para Angola. Não somente manda prender os ciganos, que o documento chama de “ladrões salteadores”, mas também seriam presos e degredados para Angola todos aqueles que se encontrarem em sua companhia ou lhes hospedarem em suas casas ou fazendas. Além disto, qualquer cidadão podia prender ciganos e entregá-los na cadéia mais próxima, podendo a pessoa tomar-lhes todos os bens, ouro, roupas ou cavalos. Porém, em 1737 o governador de Minas Gerais adverte: “Pelo que toca a ciganos as queixas que há são só por serem ciganos, sem que se aponte culpa individual (.....) tenho recomendado que prendam e me remetam os que fizerem furtos”, ou seja, não qualquer cigano apenas pelo fato de ser cigano. E como tudo que é ruim só podia ser de origem cigana, houve quem suspeitasse que a epidemia de varíola que naquele ano grassava em Minas Gerais tinha sido trazido pelos ciganos!

Dornas Filho acrescenta longas narrações sobre a ação de salteadores, principalmente na Serra da Mantiqueira, até o final do Século XVIII, citando inclusive cartas de Tiradentes que, segundo ele, “comandou por mais de uma vez a tropa de assalto ao reduto desses malfeitores, prendendo e matando ciganos às dúzias”. Ou seja, o heroi mineiro e nacional Tiradentes assassinou covardamente também algumas dezenas de ciganos, quase todos eles certamente desarmados e trabalhadores honestos, mas um genocídio que na época era motivo até de recompensas financeiras e honrarias especiais. O leitor fica com a impressão que em todos estes casos citados por Dornas Filho se trata de ciganos, porém a maioria dos documentos não faz absolutamente nenhuma referência a ciganos, mas apenas a bandidos em geral ou, quando muito, fala de “ciganos e outros malfeitores”. Alguns podem até ter sido ciganos, mas com certeza a quase totalidade destes bandidos, assaltantes e assassinos da época eram portugueses, mineiros ou brasileiros, não-ciganos. No entanto, sempre quando algo de ruim acontecia e um cigano por acaso estivesse na redondeza, já se sabia a quem atribuir a culpa. Em 1726 há notícia de ciganos em São Paulo, quando foram solicitadas medidas contra ciganos que apareceram na cidade e que eram “prejudiciais a este povo porque andavam com jogos e outras mais perturbações”, pelo que tiveram que abandonar a cidade dentro de 24 horas, sob pena de serem presos. E em 1760 os vereadores de São Paulo resolveram “que por ser notório que nesta cidade se acha um bando de ciganos composto de homens, mulheres e filhos sendo público terem sido expulsos de Minas Gerais por serem perniciosos naquelas povoações e assim se vieram acolher a esta cidade aonde já vão havendo algumas queixas (....)”. Também estes receberam um prazo de 24 horas para sair da cidade. Ou seja, trata-se da velha política de “mantenho-os em movimento”: Minas Gerais expulsa seus ciganos para São Paulo, que os expulsa para o Rio de Janeiro, que os expulsa para Espírito Santo, que os expulsa para a Bahia, de onde são expulsos para Minas Gerais, etc. Ou seja, o melhor lugar para os ciganos sempre é no bairro, no município ou no Estado vizinho; ou então no país vizinho ou num país bem distante. Um alvará de 1760 informa:
“Eu El Rei faço saber aos que este Alvará de Lei virem que sendo me presente que os ciganos que deste Reino tem sido degredados para o Estado do Brasil vivem tanto à disposição de sua vontade que usando dos seus prejudiciais costumes com total infração das minhas Leis, causam intolerável incômodo aos moradores, cometendo continuados furtos de cavalos, e escravos, e fazendo-se formidáveis por andarem sempre encorporados, e carregados de armas de fogo pelas estradas, onde com declarada violência praticam mais a seu salvo os seus perniciosissimos procedimentos; considerando que assim, para sossego público, como para correção de gente tão inútil e mal educada se faz preciso obrigá-los pelos termos mais fortes e eficazes a tomar vida civil, sou servido ordenar que os rapazes de pequena idade filhos dos ditos ciganos se entreguem judicialmente a Mestres, que lhes ensinem os ofícios e artes mecânicas, aos adultos se lhes assente praça de soldados, e por algum tempo se repartam pelos presídios de sorte que nunca estejam muitos juntos, em um mesmo presídio, ou se façam trabalhar nas obras públicas pagando-lhes o seu justo salário, proibindo-se a todos poderem comerciar em bestas e escravos e andarem em ranchos; que vivam em bairros separados, nem todos juntos, e lhes não seja permitido trazerem armas, não só as que pelas minhas leis são proibidas, que de nenhuma maneira se lhes consentirão, nem ainda nas viagens, mas também aquelas que lhes poderão servir de adorno. E que as mulheres vivam recolhidas e se ocupem naqueles mesmos exercícios de que usam as do país. E hei por bem que pela mais leve transgressão do que neste alvará ordeno, o que for compreendido, nela seja degredado por toda a vida para a ilha de São Thomé, ou do Príncipe, sem mais ordem e figura de juizo..... ”.
Ao que Oliveira China acrescenta: “A parte curiosa desse documento é a que nos revela que em nossas plagas a ‘atividade’ desses nômades não se limitou ao furto de animais, na prática do qual, como é sabido, são useiros e vezeiros; ela foi além, pois estendeu-se também ao furto ou roubo de escravos! Fato sem dúvida, original, e que ainda mais ressalta a ‘habilidade’, por assim dizer inata, que eles têm para a rapina, encarada sob todos os seus aspectos e particularidades..”. Por onde se vê que também Oliveira China não escapava dos preconceitos anti-ciganos: se os ciganos vendiam escravos, estes só podiam ser roubados, da mesma forma que qualquer cavalo de um cigano só pode ser um cavalo roubado! Nunca alguém pensa que estes cavalos ou escravos podem ter sido adquiridos honestamente. Vários outros documentos confirmam que, no Brasil, os ciganos também se dedicavam ao comércio de escravos, mas nenhum prova que roubavam escravos.

Numa carta de 1761, do governador interino José Carvalho de Andrade ao Conde de Oeiras, consta que os ciganos baianos, então já em número de “alguns mil”, tiveram antecipadamente conhecimento do alvará acima citado, pelo que “(....) foram insensivelmente desertando, o que lhes foi fácil por morar em bairros apartados, e por ser gente que costumava muitas vezes deixar as casas para irem fazer trocas e vendas pelos sertões. Ficaram poucos na cidade”. Continua a carta:
“Logo mandamos ordens a todos os ouvidores, capitães mores, juizes de fora e ordinários, que prendessem todos, os que não fossem dessas terras moradores, e ainda a esses os obrigassem à regularidade da dita lei. Escrevemos logo ao governador do Rio de Janeiro e ao de Pernambuco, para que os não deixassem viver nos matos. Alguns que nos vieram falar, e são velhos e casados os mais deles, nos requerem que lhes deixemos arrendar fazendas e viver da lavoura, o que lhe facultamos, com tanto que os filhos adultos os entreguem para soldados e os pequenos para se porem aos ofícios. As filhas será mais difícil acomodá-las, porque na Bahia não se querem servir com brancas e menos com filhas de ciganos, temendo que alguma noite se ajustem com os pais para roubar as casas e sobretudo quererem só servir-se com mulatas e pretas. (...) (Os ciganos) se se juntarem serão alguns mil em toda a capitania, além dos escravos que possuem, tais como eles, e de alguns índios que poderão coadunar. Por isso lhe temos proposto aos que nos falam, que deles se não procuro outra coisa mais, do que viver como portugueses, vassalos de S. M., que eles mesmos escolham mestres e ofícios para os filhos de menor idade e aos adultos que os tragam para se lhe assentar praça, donde eles elegerem que os velhos e casados e as mulheres se firmem em lojas de vendas nesta cidade donde lhe parecer, para que se lhe darão despachos e guias para as justiças das terras. Com isto alguns tem vindo e entregue os filhos para os ofícios e outros se lhe destina sítio perto desta cidade para lavouras, depois de trazerem arrendamentos dos senhorios....”.

Dois meses depois, numa segunda carta, o mesmo autor informa:

“Os ciganos vem vindo bastantes a querer tomar vida regrada, porque por todas as partes os prendiam ..... Os casados entregam os filhos solteiros aos oficiais mecânicos se são de idade competente e os adultos alguns assentaram praça, mas muito raros, por não apparecerem ou porque esta gente casa logo nestas terras de mui pouca idade. Os mais vão arrendando terras, ocupando-se com suas mulheres em lavouras e em abrir terras de novo, deixando totalmente o ilícito comercio e o modo libertino que tinham de vida....”.

O mesmo deve ter acontecido também em outras capitanias. Resta saber se os ciganos arrendavam propriedades rurais para se dedicarem realmente às atividades agrícolas, completamente estranhas à sua cultura por ser incompatível com a vida nômade, ou se era apenas mais uma estratégia para, longe dos olhos dos portugueses, terem pontos de apoio para continuarem, unidos e em bandos, a sua antiga vida de comerciantes de animais, de escravos e de produtos artesanais.
Pereira da Costa, falando dos ciganos em Pernambuco, também se refere a ciganos que ganhavam seu sustento honestamente:

“Os ciganos andavam em bandos mais ou menos numerosos, e aqueles que não se entregavam à pilhagem, e a certos negócios, como a compra e venda de cavalos, nos quais os indivíduos pouco experientes sempre saíam logrados, eram geralmente caldeireiros ambulantes, e onde quer que chegassem, levantavam as suas tendas, e saíam à procura de trabalho que consistia, especialmente, no conserto de objetos de latão e cobre. As mulheres, porém, importunas, astutas e nímiamente loquazes, saíam a esmolar, e liam a buena dicha pelas linhas das mãos, predizendo a boa ou má-sorte do indivíduo, mediante uma remuneração qualquer”.

A deportação de ciganos portugueses continuou pelo menos até o final do Século XVIII. De 1780 a 1786, o secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, Martinho de Melo Castro, enviou grupos de 400 ciganos anualmente para o Brasil. Julgando pelo teor de uma carta de 1793, vê-se que os ciganos deportados "não eram úteis à coroa nem ao Brasil." Mesmo assim, as deportações continuaram pelo menos até o fim do século. De acordo com uma correspondência de 1761, entre uma autoridade da Capitania da Bahia e o Conselho Ultramarino, "se se juntarem [os ciganos] serão alguns mil em toda a capitania, além dos escravos que possuem, taes como elles e de alguns índios, que poderão coadunar".

Co-autor desta parte: Frans Moonen
Diégues Junior, M., Imigração, urbanização, industrialização, Rio de Janeiro, 1964, pp. 26-28
Vilas-Boas da Mota, A.. “Os ciganos do Brasil”, Correio da Unesco, ano 12, 1984, p. 32; “Os ciganos, uma minoria discriminada”, Revista Brasileira de Política Internacional, ano XXIX, vol. 115/116, 1986, p.32.
Costa Pereira, C. da, Povo Cigano, Rio de Janeiro, 1985, p.31; “Gli zingari in Brasile”, Lacio Drom, ano 26, n. 6, 1990, p. 3; “La situazione sociale degli zingari in Brasile”, Lacio Drom, Suplemento ano. 1-2, 1992, p.121.
Donovan, B. M., “Changing perceptions of social deviance: gypsies in early modern Portugal and Brazil”, Journal of Social History, Vol. 26, 1992, p. 42; o autor informa que "o terremoto de Lisboa destruiu a maioria da documentação referente às deportações antes de 1755. O anexo dos Feitos Findos do Arquivo Nacional da Torre do Tombo possui manuscritos não-catalogados sobre deportação" (p. 52, nota 49); acrescenta-se que ainda não foi feita em Portugal nenhuma pesquisa exaustiva sobre a documentação referente a ciganos.
Coelho, A., Os ciganos de Portugal, Lisboa, Dom Quixote, 1995, pp. 199-200 [1a. edição 1892]
Coelho 1995, pp. 218-220
Couto, C., “Presença cigana na colonização de Angola”, Studia, Lisboa, no. 36, 1973, pp. 107-115.
Donovan 1992. p. 38.
Costa, F. A. Pereira da, Anais Pernambucanos, Vol. V (1701-1739), Recife, Arquivo Público Estadual, 1983. p. 299.
ORDEM por que o Excelentíssimo Senhor Vice-Rei concedeu licença a Luiz de Souza e outros, todos ciganos, todos moradores em Pernambuco para irem morar a Sergipe de El-Rei. Documentos históricos, Rio de Janeiro, vol. 69, p. 121-122, 1945. Para saber mais sobre ciganos no Nordeste deve-se consultar Costa (1983, p. 299-303). Segundo Charles R. Boxer (A idade do ouro no Brasil. São Paulo, Cia Editora Nacional, 1969. p. 371), os Anais Pernambucanos (5 volumes) de Costa foram compilados em fins do século XIX e início do século XX, embora apresentem um material significativo retirado de fontes manuscritas, "infelizmente nem sempre com as referências adequadas", baseando-se principalmente em: Fernandes Gama, J. B. Memórias históricas da província de Pernambuco. 4 vols. Pernambuco, 1844-1848.
Costa 1983, V, pp.299-300
Kidder , D. P., Reminiscências de viagens e permanências nas províncias do Norte do Brasil, Belo Horizonte, Itatiaia / São Paulo, Edusp, 1980, p. 39 [tradução da primeira parte do original de 1845].
Kidder 1980, p. 39.
China, J. B. D'Oliveira. “Os ciganos do Brasil; subsídios históricos, etnográficos e lingüísticos”, Revista do Museu Paulista, Tomo XXI, São Paulo, 1936, p. 402.
China 1936, p.402, pp.404-405
Lima Junior, A. de. A capitania de Minas Geraes; origens e formação, Belo Horizonte, Instituto de História, Letras e Artes, 1965, p. 54.
Lima 1965, p. 47, p. 60.
Dornas Filho, J, “Os ciganos em Minas Gerais”, Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Belo Horizonte, ano III, vol. III, 1948, p. 146 [este ensaio foi publicado nas pp. 138-187 da revista citada acima, mas quase todos os ciganólogos brasileiros citam uma ‘separata’ deste ensaio, que inicia na página 1].
A Capitania de São Paulo e das Minas de Ouro foi criada em 1709, separando-se do governo do Rio de Janeiro. Em 1720, Minas de Ouro desmembrou-se da Capitania de São Paulo.
Moraes Filho, A. F. de Mello, Os ciganos no Brasil & Cancioneiro dos ciganos, Belo Horizonte, Itatiaia / São Paulo, EDUSP, 1981, pp. 26-27. [edições originais de 1886 e 1885, respectivamente]
Bando de 15Jun1723 de Dom Lourenço de Almeida; apud Dornas Filho 1948.
Dornas Filho 1948, pp.11-12, p.14

População cigana no Brasil (Musical: Los Gallegos)

Quase nada sabemos sobre os ciganos brasileiros na atualidade. As pesquisas até agora realizadas no Brasil provam a existência de ciganos de pelo menos dois grupos diferentes: os Calon que migraram para o país, voluntária ou compulsoriamente, já a partir do Século XVI, e os Rom que, ao que tudo indica, migraram para o Brasil somente a partir de meados do Século XIX. Nenhuma publicação trata de ciganos Sinti, mas que com certeza também devem ter migrado para o Brasil, junto com os colonos alemães e italianos, a partir do final do Século XIX.

Segundo dados oficiais, de 1819 a 1959 migraram para o Brasil 5,3 milhões de europeus, dos quais 1,7 milhão portugueses, 1,6 milhão italianos, 694 mil espanhois, 257 mil alemães e 125 mil russos. No desembarque registrava-se apenas a nacionalidade do imigrante, e não a sua identidade étnica. É mais do que provável que no meio dos quase dois milhões de imigrantes italianos e alemães também tenham vindo ciganos Sinti, principalmente durante e após a II Guerra Mundial.
Segundo Vilas Boas da Mota, os Rom brasileiros pertencem aos seguintes sub-grupos: “Kalderash, que se consideram nobres e, por conseguinte, os verdadeiros guardiães da identidade cultural cigana; os Macwaia, muito propensos à sedentarização ... e, por isto mesmo, inclinados à perda da identidade étnica... ; os Rudari, provenientes sobretudo da Romênia, localizam-se em São Paulo e no Rio de Janeiro e com bom nível econômico-financeiro; os Horahané, oriundos da Turquia e da Grécia, são renomados vendedores ambulantes; os Lovara, em franco recesso cultural, fazem-se passar por emigrantes italianos”. Nenhum autor brasileiro faz referência a sub-grupos Calon com denominações específicas.

Também não existem dados sobre o número de ciganos no Brasil atual, nem sobre a sua distribuição geográfica. Os censos demográficos brasileiros nada informam sobre ciganos ou indivíduos que são identificados ou se auto-identificam como tais, e até hoje ninguém se interessou ou foi capaz de saber, nem sequer aproximadamente, quantos ciganos vivem num determinado Estado, e menos ainda no Brasil todo. Dispomos de dados demográficos detalhados, bastante confiáveis e constantemente atualizados sobre quase todos os povos indígenas no Brasil, mas nada sabemos sobre a demografia das minorias ciganas.

Apesar disto, Costa Pereira escreveu em 1985: “Pode-se afirmar que hoje há cerca de 150.000 ciganos espalhados por todo o Brasil, nômades ou semi-sedentários. Isto sem nos referirmos aos que negam a sua ciganidade, o que triplicaria este número”. A autora não informa como ela conseguiu contar estes 150.000 ciganos, e menos ainda como contou os cerca de 300.000 ciganos brasileiros que não mais se identificam como ciganos, ou seja, ciganos invisíveis, ou melhor ainda, do ponto de vista antropológico, ex-ciganos. Na realidade, estes números nem sequer são estimativas, mas mera fantasia, uma miragem. Em 1990, a mesma Costa Pereira, informando basear-se em dados da Romani Union de Madrid (mas sem citar a fonte bibliográfica), afirmou que a população cigana brasileira era de cerca de 800.000 pessoas, mas dois anos depois, com supostos dados da Unesco, sem maiores explicações (e mais uma vez sem citar qualquer fonte bibliográfica), diminuiu este número para 500.000. O mais grave é que estes dados foram publicados numa revista italiana, pelo que os estrangeiros podem pensar que os brasileiros, em apenas dois anos, eliminaram uns 300.000 ciganos. Um verdadeiro genocício, um novo holocausto brasileiro, e que obviamente não ocorreu!

Todos estes números, no entanto, são mera fantasia, são apenas delírios psicodélicos, porque nenhum ciganólogo, e nenhuma organização cigana ou pró-cigana de qualquer parte do Mundo, e menos ainda a Unesco, tem autoridade alguma para divulgar estimativas populacionais ciganas seja de que país for, a não ser que estas estimativas sejam baseadas em dados confiáveis fornecidos por cientistas ou instituições de pesquisa daquele país. E no Brasil, até hoje, nem o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelos censos demográficos oficiais, nem qualquer outra instituição de pesquisa demográfica, nem qualquer Organização Não-Governamental (ONG), nem cientista algum tem feito um levantamento sistemático e confiável da população cigana. Em resumo: nada, mas absolutamente nada, sabemos sobre o número de ciganos nômades, semi-nômades e sedentários atualmente existentes no Brasil, nem sobre sua distribuição geográfica.

Ciganos - Denominações e diversidade (musical: Ciganos D'Ouro)

Desde o século XV a palavra “cigano” é utilizada como um insulto. O termo aparece registrado pela primeira vez em português em A farsa das ciganas de Gil Vicente, provavelmente em 1521. Nesta obra os ciganos são considerados como originários da Grécia. No século XIX, no Brasil, não se fala nem que são originários da Grécia nem da Índia. Apesar de ganhar cada vez mais força, na Europa, a explicação de que os ciganos teriam vindo do subcontinente indiano. No entanto, há menções sobre ciganos, no Brasil, em que eles se diziam descendentes de antigos egípcios:
"No Brasil os ciganos afirmam também que procedem do Egito; e contam a velha lenda de que, por terem recusado hospedagem à Virgem Maria quando ela fugia, peregrinam sobre a terra dispersos, sem pátria, por todos os tempos."

Algumas vezes são chamados de turcos. Notícias de O Pharol, de Juiz de Fora, referem-se a esses "turcos" pedindo esmolas e impingindo bugigangas às pessoas. Há ainda uma "reclamação vinda de Porto das Flores sobre a presença de 'turcos' naquela localidade."
Em geral, nas posturas municipais que tratam de ciganos, em primeiro lugar, eles são associados às "pessoas desconhecidas e suspeitas." Em seguida, são definidos como sendo "os que são por taes havidos", ou seja, reconhecidos socialmente como ciganos. Reconhecimento dado porque eles "costumão a fazer freqüentes trocas e compras de animaes, e vendas de escravos, e não são moradores no Termo, ou não há pessoa capaz, que os conheça, e abone." Assim, eram relacionados, a priori, ao comércio de mercadorias roubadas (escravos, animais e objetos variados), a não ser que houvesse alguém que afiançasse sua honestidade. A idéia que orientava este prejulgamento, era a de que apenas seria confiável o indivíduo com residência fixa. Pois o nômade não tinha morador que o conhecesse e o abonasse.

O historiador traz na mente um cigano típico (um protótipo), mas que necessita ser desmontado pelas evidências de grupos ciganos na diversidade de situações em que se encontram. Se for sensível, compreenderá que, antes de tudo, deve desconstruir o modelo sobre os genericamente chamados ciganos. Uma história de ciganos deve ser feita de muitas exceções, impossibilidades, contradições, incongruências, contra-sensos. Essa perspectiva tem um cigano que extrapola a coerência que a escrita tradicional do historiador exige; as condições espaciais e temporais individualizam muito os ciganos; a história dos ciganos é a história de um mosaico étnico. Este cigano - total abstração - é como a repetição infinita de um modelo ou motivo que se realiza através de variantes ilimitadas. Nas últimas décadas, pesquisadores, ciganos ou não, consagraram a distinção dos ciganos, no Ocidente, em três grandes grupos. O grupo Rom, demograficamente majoritário, é o que está distribuído por um número maior de países. É dividido em vários subgrupos (natsia, literalmente, nação ou povo), com denominações próprias, como os Kalderash, Matchuara, Lovara e Tchurara. Teve sua história profundamente vinculada à Europa Central e aos Balcãs, de onde migraram a partir do século XIX para o leste da Europa e para a América. Muitas organizações ciganas e vários ciganólogos têm tentado substituir, no léxico, Ciganos por Rom. A este processo tem-se denominado romanização, e tem a intenção de conferir legitimidade a estes grupos como sendo o dos "verdadeiros ciganos." Há ainda, pelo menos, duas derivações dessa política. A primeira, a do subgrupo Kalderash, autoproclamada a mais "autêntica" e "nobre" entre as comunidades ciganas. A segunda é a do grupo lingüístico vlax romani, considerado, por muitos pesquisadores, como portador da "verdadeira língua cigana".

Fontes:
Coelho, F. A., Os ciganos de Portugal; com um estudo sobre o calão, Lisboa, Dom Quixote, 1995. (Original: 1892). p. 199-200.
Bourdieu, P. , Questões de Sociologia, Rio de Janeiro, 1983. p. 30.
Acton, Th., Gypsy politics and social chance, London and Boston, Routledge & Keghan Paul, 1974. p. 54.
Bluteau, R., “Cigano”, In: Vocabulário portuguez, & latino, aulico, anatomico, architectonico...; tomo II, Coimbra, Real Collegio das Artes da Companhia de Jesu; Lisboa Ocidental, Pascoal da Sylva, 1712. p. 311-312.
Donovan, B., “Changing perceptions of social deviance: gypsies in early modern Portugal and Brazil”, Journal of Social History, Vol. 26, 1992, p. 35.
Silva, A. de Moraes, “Cigano”, Dicionário da lingua portuguesa, Rio de Janeiro, Officinas de S.A. Litho-Typographia Fluminense, 1922, Tomo Primeiro. p. 396.
Schwarcz, L. Moritz, O espetáculo das raças; cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930. São Paulo, Cia. das Letras, 1993. p. 13.
Passando de cerca de 60 mil em 1808 para 122.695 habitantes em 1821, ano de regresso da família Real para Portugal; cf. Mattos, I. Rohloff, O tempo Saquarema; a formação do estado imperial., São Paulo, Hucitec, 1990. p. 50.
Fraga Filho, W., Mendigos, moleques e vadios na Bahia do século XIX, São Paulo, HUCITEC; Salvador, EDUFBA, 1996, p. 179.
Schwarz, 1993. p. 13.
Cf. Dornas Filho, J., “Os ciganos em Minas Gerais”, Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Belo Horizonte, ano III, vol. III, 1948, p. 166.
Fraser, A., The gypsies, Oxford, Blackwell Publishers, 1992, p. 48.
Vicente, G., Obras completas, Vol. 5, 3ª ed. Lisboa, Livraria Sá da Costa, s.d. [“A farsa das ciganas” (1521?), pp. 319-329].
Pohl, J. B. E., Viagem no interior do Brasil,, [Primeira Parte], Rio de Janeiro, MEC/INL, 1951 (Original: 1832), p. 274.
Goodwin Junior, J. W., “Império do Brasil: nesta nação nem todo mundo é cidadão!”, Caderno de Filosofia e Ciências Humanas, Belo Horizonte, ano V, nº 9, 1997. p. 32; baseando-se em: O Pharol, Juiz de Fora, 27 set. 1884 e 07 fev. 1885.
Goodwin Junior 1997, p. 32; baseando-se em O Pharol, Juiz de Fora, 07 abril 1988.

"A grande falha da literatura sobre ciganos, oficial e acadêmica, é a supergeneralização, observadores têm sido facilmente levados a acreditar que práticas de grupos particulares são universais, com a concomitante sugestão de que qualquer grupo que não seguisse as mesmas práticas não seriam 'verdadeiros' ciganos." (Acton, Th., Gypsy politics and social change, London and Boston, Routledge & Kegan Paul, 1974. p. 3).

Rom, substantivo singular masculino, significa homem e, em determinados contextos, marido; plural Roma; feminino Romni e Romnia. O adjetivo romani é empregado tanto para a língua quanto para a cultura. Apesar disto, como fazem muitos outros ciganólogos, a seguir sempre escreveremos "os Rom" e não "os Roma", da mesma forma "os Calon", "os Sinti", etc. Na falta de um acordo formal sobre a grafia das autodenominações ciganas, aplicou-se também a estas a "Convenção para grafia dos nomes tribais", que "se escreverão com letra maiúscula, facultando-se o uso de minúscula no seu emprego adjetival", e "os nomes tribais não terão flexão portuguesa de número ou gênero, quer no uso substantival, quer no adjetival" (“Convenção para a grafia dos nomes tribais”, Revista de Antropologia, São Paulo, vol. 2, nº 2, 1954, p. 152).
Os Sinti, também chamados Manouch, falam a língua sintó e são numericamente expressivos na Alemanha, Itália e França. No Brasil, nunca foi feita uma pesquisa apurada sobre sua presença. Provavelmente, os primeiros Sinti chegaram ao país também durante o século XIX, vindos dos mesmos países europeus já mencionados.
Os Calon, cuja língua é o caló, são ciganos que se diferenciaram culturalmente após um prolongado contato com os povos ibéricos. Da Península Ibérica, onde ainda são numerosos, migraram para outros países europeus e da América. Foi de Portugal que vieram para o Brasil, onde são o grupo mais numeroso. Embora os Calon tenham sido pouco estudados, acredita-se que não haja entre eles algo que se assemelhe à complexa subdivisão dos Rom.

Historicizar os ciganos nos remete a compreendê-los na sua pluralidade e no seu excepcionalismo. Há uma generalidade reducionista ao se chamar de ciganos indivíduos e/ou comunidades com diferenças significativas entre si. Precisa-se, assim, tomar cuidado ao denominar "cigana" a identidade de grupos que chegaram ao Brasil deportados de Portugal, desde o século XVI e, ao mesmo tempo, a identidade de famílias oriundas dos Balcãs e da Europa Central, que chegaram ao país no final do século XIX. Trata-se de uma enganosa generalização, sem dúvida, pois que o espaço e o tempo modificam sensivelmente a constituição desses "sujeitos". Assim, um cigano Calon e um cigano Rom só possuem predicado idêntico no domínio da linguagem, quando emitimos proposições como: "Este Calon é cigano" ou "Aquele Rom é cigano". Mas a percepção atenta das singularidades nega, taxativamente, a suposta identidade dos nomes e dos predicados.
Em contraposição a isso tudo, os ciganos pensam em si próprios de forma fragmentária. Cada cigano tem uma forte identificação com seu grupo familiar ou com as famílias que têm o mesmo ofício. Mas não existe uma identidade única entre todos os ciganos. Entretanto, apesar de não corresponder aos atributos percebidos ao nível da singularidade dos indivíduos, o tempo cigano é capaz de nos levar a um reconhecimento ou a uma diferenciação mínima. Por exemplo, não se confundia um cigano com um índio ou um mascate libanês.

Quando alguém usa o predicado "cigano" para qualquer "sigano" ou "pessoa assiganada" (como aparece em documentos coloniais), está querendo propor que este predicado representa uma relação de semelhança entre identidades. Isso é aceitável. Mas não concordamos com a concepção ingênua de que esse predicado estivesse contendo uma correspondência perfeita com os seus referentes.
No domínio dos ciganos, não existem senão múltiplas identidades. Daí que o termo cigano não designa as comunidades por nomes que elas próprias dão para si. Ele designa, isto sim, uma abstrata imbricação de comunidades ciganas. A diferença é muito grande, pois na realidade não existem ciganos, mas sim diversas comunidades (historicamente diferenciadas) chamadas de ciganas, mantendo relações de semelhança e/ou dissemelhança umas com as outras. O termo cigano traz consigo uma série de inquietudes semânticas, ideológicas, antropológicas etc. Uma vez diagnosticada a complexidade e as ambigüidades inerentes à referida expressão, ao dissertarmos, torna-se impossível termos pretensões de elaborar sínteses conclusivas. Pois o complexo de certezas sobre o qual se apoia essa noção é bastante instável. A dispersão e o nomadismo, que tiveram início há mais de dez séculos, propiciou tantos contatos interétnicos e adaptações às condições espaço-temporais, que aplicar qualquer termo para o conjunto das comunidades ditas ciganas é um tanto arriscado.

O que nos parece claro é que os ciganos não são um grupo religioso ou uma nacionalidade. Além do mais, preferiu-se não chamar os ciganos de povo, pois também esta expressão tem significados pouco precisos e muito ambíguos. Na falta de um vocábulo que designe com propriedade o conjunto completo de todas as comunidades ciganas, adotar-se-á a expressão "ciganos", cujo sentido é aceito na sua generalidade, para referir-se a todos os indivíduos assim chamados. Embora se reconheça que tal uso nunca tenha tido plena legitimidade no seio das várias comunidades analisadas. A categoria "cigano" opera inúmeras descontinuidades, enquanto a narrativa do historiador necessita de conceitos que expressem um mínimo de continuidade. Ao contrário, estar-se-ia a cada momento escrevendo a história de um novo objeto de estudo. Os segmentos do mosaico existem, sobretudo, no domínio das descrições ou das teorias ciganológicas, influenciada pela insistência de classificação neopositivista. Ora, o que temos são grupos e suas variantes, decorrentes de combinações diversas, condicionadas por tempos e espaços particulares. Assim, os ciganos são múltiplos e unos. Nenhum cigano conhece todos os detalhes da identidade em que está inserido. Tal como não conhece todo o espaço cultural que o comporta, não sabendo, pois, ler todo o seu "mapa cultural". Toda cultura, afinal, oferece uma margem de manobra para os seus membros. Há aspectos da identidade cigana compartilhados por todos os ciganos, outros que são particulares de cada subgrupo e ainda outros selecionados pelo indivíduo num leque de opções. Cada cigano é portador de um conjunto singular de elementos dessa identidade, embora, não haja uma noção de individualidade tal como no mundo ocidental.

Toda história dos ciganos é, na verdade, uma viagem nas línguas, nas estéticas, nas políticas antivagabundos e antiartistas, nas religiões, nas concepções de mundo, com os quais vários grupos ciganos, sucessiva e contraditoriamente, tiveram contato. Nisso a universalidade dos ciganos se manifesta. Nesta história dos ciganos a diferença não pode se dissipar. Para ser honesta, ela deve mostrar muitas precauções para não condensar num padrão as particularidades de grupos variados (em momentos e espaços distintos), porque assim o discurso perderia informação, e a história, o sentido. Não se pode também confundir os ciganos com os discursos que os descrevem, ainda que se reconheça a existência de uma conexão entre eles. Dito isto, ressalta-se que as diferenças e a diversidade entre os ciganos não impedia que houvesse solidariedade. Os ciganos faziam da própria fluidez, da flexibilidade, de sua identidade um fator de fortalecimento desta solidariedade. Pois rearranjavam sua identidade de acordo com suas necessidades, por meio de alianças matrimoniais ou pelas festas que envolviam comunidades distintas. Além disto, colocadas em oposição aos não-ciganos, as várias comunidades se sentiam irmanadas.


As narrativas históricas sobre os ciganos, muitas vezes, perdem-se pela generalização exagerada (fala-se dos "ciganos" como tendo apenas uma única cultura); apenas umas poucas linhas sustentam o caráter diferencial de cada comunidade cigana estudada. E quando os autores se cansam das individualidades, esboçam a unidade (frágil e talvez inexistente) de múltiplos ciganos. Tanto o historiador quanto o ciganólogo escrevem como se todos os ciganos fossem apenas um só (o "cigano típico" ou o "cigano genérico"). Portanto, resta desconstruir essa unidade discursiva sobre os ciganos, pelo estudo das particularidades do caso em questão, tentando perceber as visões positivas e negativas que orientaram as ações da sociedade mineira frente aos ciganos. E também, como os ciganos flexibilizaram sua identidade diante das transformações conjunturais pelas quais passaram.

História dos Ciganos no Brasil (vídeo: Doces Vales de Sonhos)

INTRODUÇÃO - Os ciganos, Rodrigo Corrêa Teixeira

Este livro tenta narrar, na medida do possível, parte da história de um povo, ou melhor, de um conjunto de comunidades dispersas pelas mais diversas regiões do Brasil, os assim chamados “ciganos”. Suas origens são incertas, seus costumes e línguas variam entre os muitos grupos em que se dividem. As relações entre estes assim chamados ciganos e os membros das sociedades envolventes, por terem se diferenciado bastante, no tempo e no espaço, nunca forma tranqüilas.

Video aborda o desenvolvimento econômico da região de Itabaiana, Sergipe, Brasil, a partir do desenvolvimento agrícola desde meados do século XVIII. Introdução e contexto histórico. A importância das navegações portuguesas para a civilização atual.
À parte a complexa definição da identidade cigana, a documentação conhecida indica que sua história no Brasil iniciou em 1574, quando o cigano João Torres, sua mulher e filhos foram degregados para o Brasil. Em Minas Gerais, a presença cigana é nitidamente notada a partir de 1718, quando chegam ciganos vindos da Bahia, para onde haviam sido deportados de Portugal.

Em Minas Gerais, durante o século XIX, praticamente só se falava de ciganos quando sua presença inquietava as autoridades. Isto ocorria, por exemplo, quando eram acusados de roubarem cavalos. Nas poucas vezes que se escrevia sobre aspectos culturais dos ciganos, não havia qualquer interesse sobre como eles próprios viam sua cultura. Os contadores da ordem pública, com os chefes de polícia, os compreendiam como sendo "perturbadores da ordem", responsáveis pelos mais hediondos crimes. Outras fontes, como viajantes e memoralistas, recorriam aos estereótipos corriqueiros, como "sujos", "trapaceiros" e "ladrões". Isto funciona como um indicador: os ciganos eram raramente considerados por si mesmos, e com freqüência, eram sinônimos de barbárie, imundice, desonestidade e imoralidade. Assim, a documentação se detém pouco sobre os ciganos singulares, que tornam-se desprovidos de existência. Quase sempre incidem sobre "o cigano", entidade coletiva e abstrata à qual se atribuem as características estereotipadas.

A documentação sobre ciganos é escassa e dispersa. Sendo ágrafos, os ciganos não deixaram registros escritos. Assim, raramente aparecendo nos documentos, aproximamo-nos deles indiretamente, através de mediadores, chefes de polícia, clérigos e viajantes, por exemplo. Nestes testemunhos, a informação sobre os ciganos é dada por intermédio de um olhar hostil, constrangedor e estrangeiro. Os ciganos nas cidades mineiras estavam em dissonância aos ideais de civilização e progresso, tão marcantes deste período. São identificados como elementos incivilizáveis, inúteis à sociedade, supersticiosos, corruptores dos costumes, vândalos, enfim, uma anomalia social e racial. Uma vez vistos desta maneira, as autoridades tentavam controlá-los, no entanto, sem obterem grande eficácia. No final do século XIX e início do XX, ocorreu o ápice dos confrontos entre a polícia e os ciganos. Foram as "Correrias de ciganos" que, como veremos mais adiante, eram movimentações destes em fuga, por estarem sendo perseguidos pela polícia. Nestas correrias haviam freqüentes tiroteios, que resultaram em mortos de ambos os lados. A fim de adiantarmos algo sobre a percepção das nuances no discurso sobre os ciganos, iremos dar uma rápida prova disto, analisando duas definições de ciganos em dicionários. Pierre Bourdieu, acertadamente, afirma que "o dicionário está cheio de uma certa mitologia política". No entanto, quando se fala da opinião formada em torno dos ciganos, deve-se considerar que algumas vezes, eles mesmos contribuíram para a construção de uma "mitologia". Assim, "em algumas ocasiões, as autoridades locais e os próprios ciganos produziram por diferentes razões ideológicas, mitos coincidentes sobre o verdadeiro cigano."
Primeiramente, vejamos como o Padre Raphael Bluteau, autor do primeiro dicionário de Portugal, repercute as preocupações que a Igreja tinha com o comportamento considerado herege dos Ciganos, no início do século XVIII:

Ciganos – Nome que o vulgo dá a uns homens vagabundos e embusteiros, que se fingem naturais do Egito e obrigados a peregrinar pelo mundo, sem assento nem domicílio permanente, como descendentes dos que não quiseram agasalhar o Divino Infante quando a Virgem Santíssima e S. José peregrinavam com ele pelo Egito.
O fato de não empregarem os sacramentos católicos (casamento ou batismo de crianças, por exemplo), em favor de seus costumes, desafiava a moral religiosa, que pretendia controlar todas as parcelas da sociedade. Tomada como afronta a Igreja, as cerimônias que os ciganos faziam a sua maneira, gerou uma duradoura antipatia do clero. Embora a "feitiçaria" cigana poucas vezes ia além da prática da buena dicha, ela era rigorosamente atacada pelos religiosos. O agravante disto, era que uma vez atingida a Igreja, a coroa Portuguesa também se sentia afetada.

No século XIX, os ciganos continuaram a serem vistos como um grupo desprezível, por não se guiarem por preceitos católicos. No entanto, esta visão foi suavizada, porque a compreensão dos ciganos enquanto raça e grupo socialmente desclassificado obteve maior importância.
Um século depois, o dicionário do Padre Blateau passou a ser reeditado sob a direção do brasileiro Antonio de Moraes Silva, que define os ciganos da seguinte forma:
"Raça de gente vagabunda, que diz vem do Egito, e pretende conhecer de futuros pelas rayas, ou linhas da mão; deste embuste vive, e de trocas, e baldrocas; ou de dançar, e cantar: vivem em bairro juntos, tem alguns costumes particulares, e uma espécie de Germania com que se entendem. (...) Cigano, adj. que engana com arte, subtileza, e bons modos."

As idéias de trambiqueiros, de divulgarem terem vindo do Egito, e a de vagabundo, que contém em si também a de nômade, permanecem. Mas as menções religiosas foram retiradas, e não apenas porque o novo editor não era um clérigo, mas porque realmente a imagem se transformou. Continuavam como um grupo criminalizado, mas dá-se ênfase aos seus aspectos culturais.
Na consulta de outras fontes, muitos outros adjetivos negativos foram listados; imorais, sem honra, gananciosos, esbanjadores, sujos etc. Cada uma destas imagens teve períodos de maior e menor destaque. Além disto, combinaram-se entre si das mais diversas maneiras, produzindo um painel extremamente amplo de imagens dos ciganos.

A história e os ciganos.
Da simples intenção de se estudar os ciganos em Minas Gerais durante o século XIX à construção da hipótese principal, foi preciso que o árduo trabalho de arquivo, em conexão com uma bibliografia sobre o período e sobre os ciganos, fosse realizado num ir e vir incessante.
Comparando os restritos testemunhos literários, com os relativamente abundantes trechos de memórias e relatos de viagens, a série de posturas municipais, as notícias de jornais, a documentação policial e outras fontes menos expressivas, conseguiu-se perceber tanto as semelhanças e diferenças do todo dessa documentação quanto estabelecer referências mais precisas para as balizas cronológicas. Primeiramente, abriram-se duas possibilidades de estudo: a transformação do papel sócio-econômico dos ciganos e as mudanças na imagem que a sociedade formara deles. E descartar a perspectiva de um estudo exaustivo do cotidiano cigano, já que as fontes não propiciavam fazê-lo.

As datas limites deste estudo são 1808 e 1903. Este período de quase cem anos justifica-se pela primazia dada às relações entre os ciganos e a sociedade que os abriga. Isso requisitou uma perspectiva que permitisse perceber um movimento, relativamente lento, de transformação das imagens e dos papéis dos ciganos na sociedade. Também a escassez da documentação exigiu que se estendesse tanto os marcos temporais. Pois apenas assim foi possível compreender determinados sentidos da documentação que, se considerada parcialmente e em períodos menores, não permitiria tal contemplação. A instalação da Corte Portuguesa no Rio de Janeiro em 1808, junto com as suas conseqüências imediatas (como a abertura dos portos às nações amigas leia-se Inglaterra) e as muitas mudanças profundas na política, economia e sociedade (principalmente, a interiorização da metrópole), proporcionou a ascensão sócio-econômica dos ciganos, principalmente dos comerciantes de escravos, no Rio. Os ciganos, em Minas Gerais, viveram um momento de expansão desse tipo de comércio, embora não tivessem gozado do mesmo prestígio e riqueza que seus congêneres cariocas.
Em 1798, a população escrava representa 48,7% do total populacional. Isto dá uma idéia da importância do mercado escravista no Brasil. Aproveitando-se do aquecimento econômico, atrelado ao estrondoso crescimento populacional vivido pela cidade do Rio de Janeiro, os ciganos, estabelecidos de forma concentrada no Campo de Santana, aproveitaram-se do espaço desocupado no mercado de escravos de segunda mão, que atendia a proprietários de plantéis menores.
Além dos mercados na rua do Valongo, os ciganos comerciaram escravos por várias partes do interior do país; em Minas Gerais, podemos confirmar que tiveram um papel importante nesse comércio. Isto proporcionou uma maior aceitação e mesmo valorização social dos ciganos, já que exerciam uma atividade reconhecida como útil por grande parte da população. Alguns ciganos tornaram-se ilustres, patrocinando até festividades na Corte. Esse momento sui generis da história cigana no Brasil coincidiu com a ascensão do movimento romântico na Europa que repercutia no Brasil, com a visão de que o cigano era a encarnação dos ideais da vida livre e integrada a natureza. Além disso, houve uma idealização da mulher cigana, agora não mais uma miserável e desonesta quiromante, mas uma mulher forte, sensual e, ainda que vingadora e passional, fascinante.

Em fins da década de 1820, viram esse breve momento de prestígio começar a ruir, com os movimentos políticos pela Independência. Somaram-se a isso, a partir de meados do oitocentos, os golpes fatais sobre o escravismo (1850, 1871 e que culminaram com 1888).
O impulso que a política de construção de uma identidade nacional teve, a partir da Independência, gerou um cerceamento cada vez maior tanto dos deslocamentos quanto da própria identidade dos ciganos. Tal fato se deu pelo crescimento de importância da idéia de modernização e civilização dos costumes junto às elites brasileiras, que "pretenderam estabelecer um reordenamento físico das cidades, higienizar as vias públicas e excluir dos centros urbanos todos os indivíduos que não se adequaram à nova ordem." Embora "civilização" e "progresso" fossem expressões fundamentais na cultura européia desde os fins dos setecentos, no Brasil, foi no transcurso do século XIX que se almejaram tais metas, cada vez mais. Desse momento em diante, intensificou-se a repressão às populações marginalizadas, entre elas os ciganos. Eles tanto não se enquadravam na nova ordem como, também, segundo a sociedade acreditava, a ameaçavam. Assim, a segregação ou expulsão dos ciganos da cidade passa a integrar o projeto "civilizador" das autoridades imperiais.
A condenação pública do escravismo cada vez mais acentuada e as respectivas leis restritivas debilitaram o comércio escravista e os ciganos passaram a se concentrar nas transações de cavalos e mulas. Em 1872, a população escrava era apenas de 15,2%, muito distante dos quase 50% de sete décadas antes. O comércio de escravos foi sendo visto, no transcurso da segunda metade do século XIX, cada vez mais como um ofício degradante e vil. Após a abolição da escravatura, em 1888, os poucos ciganos que ainda insistiam neste comércio, perderam sua principal fonte de renda e se tornaram miseráveis (como tantos outros ciganos na época) o que os levou a tentar se adaptar à nova conjuntura sócio-econômica. Dos fins do período Imperial até os primeiros anos depois de instalada a República, ocorreram inúmeras diligências policiais no encalço de bandos ciganos em Minas Gerais, que resultaram em sangrentos confrontos. Os anos de maior destaque dessas fugas e perseguições relatadas na imprensa e nos relatórios policiais, foram 1892 e 1897. Depois de 1903, no entanto, foi interrompida a enorme preocupação policial com os ciganos, desaparecendo as referências documentais sobre correrias ciganas. Passados alguns anos, eventualmente, houve problemas entre ciganos e polícia (1909, 1912, 1916 e 1917). Mas não houve qualquer continuidade das "Correrias de Ciganos" ocorridas até 1903, o que justifica o marco cronológico final.

Não se conseguiu identificar, na lacuna que se seguiu (pela ausência de acontecimentos) o fim das correrias. Nem o contexto histórico forneceu indícios que pudessem sustentar qualquer hipótese viável para o término desses eventos. No entanto, hipoteticamente, pode-se considerar que o grande afluxo de imigrantes tenha polarizado, cada vez mais, as preocupações das autoridades, que tentavam estabelecer planos de assimilação para eles. Com isto, tendo um problema demograficamente mais importante para resolver, o controle sobre os ciganos pode ter se tornado frágil. Também, como hipótese, outro fator pode ter atuado: os ciganos teriam, gradativamente, se reacomodado econômica e socialmente, estabilizando seus negócios e necessitando de realizar menos movimentações, que tanto preocupavam as autoridades policiais.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Florais de Bach - Aspectos (vídeo: curso on line)


MEDO
ROCK ROSE - Hellianthemum nummularium
Aspecto negativo: medo ao extremo, terror e pânico. Emergências graves.
Aspecto positivo: coragem heróica. Desprendido de si próprio.
MIMULUS - Mimulus guttatus
Aspecto negativo: medo e temores de coisas conhecidas, de doenças, dor, escuro, pobreza. Acanhamento e timidez.
Aspecto positivo: coragem de enfrentar todas as situações sem medo.
CHERRY PLUM - Prunus cerasífera
Aspecto negativo: descontrole mental, emocional ou físico. Medo de perder o controle e prejudicar alguém ou a si mesmo.
Aspecto positivo: controle emocional e mental, clareza de pensamento e sentimentos.
ASPEN - Populus tremula
Aspecto negativo: medo vago e indefinido, medo do desconhecido, ansiedade, apreensão, maus pressentimentos e presságios.
Aspecto positivo: viver o novo como uma aventura e confiança no Divino.
RED CHESTNUT - Aesculus carnea
Aspecto negativo: preocupação ou medo que aconteça algo de ruim com seus seres queridos. Pensamentos desprotetor.
Aspecto positivo: Pensamento protetor e positivo em relação ao seres queridos.

INSEGURANÇA
CERATO - Ceratostigma willmottiana
Aspecto negativo: dúvida de suas decisões, precisa de confirmação dos outros. Não confiança em sua voz interior.
Aspecto positivo: confia em sua intuição , na sua voz interior.
SCLERANTHUS - Scleranthus annuus
Aspecto negativo: indecisão, hesitação entre duas opções, vacilante, desequilíbio e oscilação de humor e sintomas.
Aspecto positivo: equilíbio, clareza de decisão acompanhada de ações.
GENTIAN - Gentiana amarella
Aspecto negativo: desanimado, facilmente desencorajado por uma causa, perdeu a fé. Dúvida pela perda da fé.
Aspecto positivo: otimismo e perseverança, confiança na Providência Divina.
GORSE - Ulex europaeus
Aspecto negativo: desânimo muito grande, perdeu a esperança. desistiu de lutar. Exemplo: "não adianta mesmo..."
Aspecto positivo: esperança, luta até o final.
HORNBEAM - Carpinus betulus
Aspecto negativo: insegurança em relação a sua energia para realizar trabalho e as obrigações, mas tem energia para o prazer. Preguiça.
Aspecto positivo: segurança e ânimo para realizar as obrigações, as tarefas do dia-a-dia, com prazer e satisfação.
WILD OAT - Bromus ramosus
Aspecto negativo: incerteza e insatisfação na escolha de uma vocação ou de um caminho, não sabe a direção de sua vida, se sente como um "peixe fora d'água", sem rumo de vida, perdido.
Aspecto positivo: vocação definida. Sabe o que quer da vida, dá direção, perseverança.

FALTA DE INTERESSE NO PRESENTE
CLEMATIS - Clematis vitalba
Aspecto negativo: sonhadores, vivem sonhando com o futuro. Idealizam muito mas tem dificuldade de concretizar suas idéias.
Aspecto positivo: interesse vivo em tudo, inspiração. "Pé no chão", concretiza seus ideais, criatividade.
HONEYSUCKLE - Lonicera caprifolium
Aspecto negativo: nostalgia vive preso às lembranças do passado, dos bons tempos. Saudades.
Aspecto positivo: capacidade de lembrar o passado, mas ao mesmo tempo viver o presente em sua plenitude. Dá o entendimento das vivências mal resovidas do passado.
WILD ROSE - Rosa canina
Aspecto negativo: apatia e resignação. Não se esforça por melhorar, nem luta por nada. Conformado com a vida, tanto faz viver ou morrer.
Aspecto positivo: vivo interesse nas coisas. Capacidade de gozar a vida. Participar da vida com vibração com luz, alegria.
OLIVE - Olea europaea
Aspecto negativo: exaustão, completo esgotamento físico e mental. Falta de energia vital.
Aspecto positivo: energia da vida e luta para enfrentar as dificuldades de nossa existência.
WHITE CHESTNUT - Aesculus hippocastanum
Aspecto negativo: mente perturbada por pensamentos indesejados e persistentes. Tormento mental.
Aspecto positivo: mente calma e tranquila, calma de pensamento.
MUSTARD - Sinapsis arvensis
Aspecto negativo: tristeza profunda, melancolia súbita sem explicação, que vem e vai sem sabermos o porquê.
Aspecto positivo: estabilidade, alegria, serenidade dentro do nosso coração.
CHESTNUT BUD - Aesculus hippocastanum
Aspecto negativo: não aprende com as experiências, repete sempre os mesmos erros.
Aspecto positivo: observa tudo ao seu redor. Aprende com as experiências da vida.
SOLIDÃO
WATER VIOLET - Hottonia palustris
Aspecto negativo: sério, reservado, fechado, não interfere nos assuntos alheios.
Aspecto positivo: alegre, consegue compartilhar seus conhecimentos e vivências, doando e participando da vida.
IMPATIENS - Impatiens glandulifera
Aspecto negativo: irritabilidade e impaciência com pessoas mais lentas, ansiedade e tensão mental. Rapidez no pensar e no agir.
Aspecto positivo: compreensão e paciência com os demais, ritmo harmônico.
HEATHER - Calluna vulgaris
Aspecto negativo: centrado em si mesmo, necessita contar seus problemas a todos. Detesta ficar só.
Aspecto positivo: conségue ser compreendido pelos outros, tem a comunicação clara e profunda.

HIPERSENSIBILIDADE A INFLUÊNCIAS E IDÉIAS
AGRIMONY - Agrimonia eupatoria
Aspecto negativo: esconde uma tortura interna atrás de uma fachada de alegria. Náo assume seus sentimentos.
Aspecto positivo: consegue ser verdadeiro e demonstra o que realmente sente. Alegria espontânea.
CENTAURY - Erythraea centaurium
Aspecto negativo: vontade e personalidade dominada por alguém ou algo, submisso a vontade do outro.
Aspecto positivo: Vontade forte e definida. Serve ao outro mas preserva a sua vontade própria.
WALNUT - Juglans régia
Aspecto negativo: dificuldade de se adaptar em períodos de transição e ou mudança como: puberdade, menopausa e divórcio. Sofre influências externas do presente e do passado.
Aspecto positivo: mantém a individualidade, não se afeta por opiniões ou influências. Rompe laços do passado.
HOLLY - Ilex aquifolium
Aspecto negativo: injustiçado pela vida, sente ódio, raiva, vinga-se.
Aspecto positivo: vence as dificuldades aceitando-a e transformando-as com amor e dedicação.

DESALENTO E DESESPERO
LARCH - Larix decídua
Aspecto negativo: não confia em sua capacidade, antecipação e medo do fracasso, não se arrisca. Sentimento de inferioridade, se desvaloriza.
Aspecto positivo: confia em sua capacidade e desenvolve seus potenciais latentes.
PINE - Pinus sylvestris
Aspecto negativo: culpa, auto-reprovação por seus atos, fica se julgando por tudo e culpa-se por erros alheios.
Aspecto positivo: merecimento de ser feliz na existência, os erros são para o crescimento.
ELM - Ulmus procera
Aspecto negativo: entra em desespero pela sobrecarga de obrigações que a vida Ihe impõe, mas acredita em sua capacidade.
Aspecto positivo: assume sua responsabilidade, vendo saída de como lidar com sua sobrecarga de obrigações.
SWEET CHESTNUT - Castanea sativa
Aspecto negativo: angústia extrema, desolação, sentimento de ter chegado ao limite da resistência. Quando se busca a luz no fim do túnel, para a saída de seu sofrimentos.
Aspecto positivo: encontrar a saída do seu sofrimento para ser feliz, para se conectar com o Superior, O que tudo pode.
STAR OF BETHLEHEM - Ornithogalum umbellatum
Aspecto negativo: para os efeitos de perda ou choque físico, mental ou emocional. Necessidade de ser consolado por grandes perdas e traumas.
Aspecto positivo: corpo e mente, livres de tensão e resquícios de trauma, tem o consolo da alma.
WILLOW - Salix vitellina
Aspecto negativo: ressentimento, rancor, amargura. Sente-se injustiçado pela vida. Muita tristeza e negativismo.
Aspecto positivo: grande otimismo, positivismo, assume a responsabilidade por sua própria vida e felicidade.
OAK - Quercus robur
Aspecto negativo: normalmente forte e corajoso, um lutador, não se rende a doença ou adversidades. Só pensam em trabalhar e servir e esquecem do lazer não respeitam seu limite.
Aspecto positivo: bravo "lutador", forte, respeita seus limites e realiza o seu trabalho de vida.
CRAB APPLE - Malus pumila
Aspecto negativo: sente-se sujo, na mente e no corpo, auto condenação, vergonha de si mesmo, não gosta de sua aparência.
Aspecto positivo: melhora a auto-estima, amor a si mesmo, sente purificado física e mentalmente.

PREOCUPAÇÃO EXCESIVA COM OS OUTROS
CHICORY - Cichorium intybus
Aspecto negativo: possessividade em extremo, super protetor egoísta, exige respeito e obediência. Cobra tudo o que faz pelo outro, ciúmes possessivo.
Aspecto positivo: totalmente desprendido de si mesmo em favor do bem-estar dos outros, amor incondicional, confia no sentimento do outro.
VERVAIN - Verbena officinalis
Aspecto negativo: excesso de entusiasmo, eufórico. Quer convencer todos a suas próprias idéias, fanático e luta por causas justas.
Aspecto positivo: entusiasmo verdadeiro, vibra o que acredita.
VINE - Vitis vinifera
Aspecto negativo: dominante, inflexível, ambicioso, caráter forte, impõe sua vontade.
Aspecto positivo: inteligente, líder compreensivo e forte, vê a saída em situações difíceis.
BEECH - Fagus sylvatica
Aspecto negativo: intolerante e crítico, arrogante, tendência a julgar tudo e todos, só vê o lado negativo do outro.
Aspecto positivo: perfeita tolerância em relação a tudo e a todos, vê o lado positivo dos outros.
ROCK WATER
Aspecto negativo: rigidez moral, auto-exigência muito grande, desejo de ser tomado como exemplo. Se nega e se reprime, rígido e austero consigo mesmo e até com os outros.
Aspecto positivo: vive em harmonia, perfeição, a vida flui e é mais leve, sem cobranças, com a mente aberta.




JcShow

O que é ser Voluntário!

Acordemos

É sempre fácil examinar as consciências alheias, identificar os erros do próximo, opinar em questões que não nos dizem respeito, indicar as fraquezas dos semelhantes, educar os filhos dos vizinhos, reprovar as deficiências dos companheiros, corrigir os defeitos dos outros, aconselhar o caminho reto a quem passa, receitar paciência a quem sofre e retificar as más qualidades de quem segue conosco... Mas enquanto nos distraimos, em tais incursões a distância de nós mesmos, não passamos de aprendizes que fogem, levianos, à verdade e à lição. Enquanto nos ausentamos do estudo de nossas próprias necessidades, olvidando a aplicação dos princípios superiores que abraçamos na fé viva, somos simplesmente cegos do mundo interior relegados à treva... Despertemos, a nós mesmos, acordemos nossas energias mais profundas para que o ensinamento do Cristo não seja para nós uma bênção que passa, sem proveito à nossa vida, porque o infortúnio maior de todos para a nossa alma eterna é aquele que nos infelicita quando a graça do Alto passa por nós em vão!... Xavier, Francisco Cândido. Da obra: Caridade. Ditado pelo Espírito André Luiz. Araras, SP: IDE. 1978.